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Foto do escritorAero Latina

A primeira vítima da FAB na 2ª Guerra teria sido abatido sobre a PB?



A história da Base Aérea de Natal (BANT) se confunde com a do Brasil na segunda guerra mundial. O relato que vem a seguir comprova mais uma vez esta afirmação, a partir do momento que vamos contar o caso da primeira vítima aérea militar brasileira no conflito bélico.

Na verdade, são três vítimas da Força Aérea Brasileira (FAB), mortos em um dos mistérios não esclarecidos da guerra e que gera dúvidas até os dias atuais, que envolve um avião, modelo Fairchild 24 “Forwarders”, designação militar UC-61, que caiu em rota da Base Aérea de Recife (BARF) para Natal, na divisa do RN com a Paraíba. Trata-se do “acidente” que vitimou o tenente José de França Paula Reis, o aspirante Gabriel Evangelho Menna Barreto e o sargento Waldir Correia, ocorrido em dezembro de 1942.

Fairchild 24 “Forwarders” designação militar UC-61, FAB 2681 (Acervo Fred Nicolau - Centro Cultural Trampolim da Vitória)

O tenente França iniciou sua carreira militar em 1940, quando ingressou para a 2ª Esquadrilha de Adestramento Militar da Aviação Naval, sendo transferido para o Ministério da Aeronáutica em fevereiro de 1941, quando atuou no Correio Aéreo Nacional, a partir da Base Aérea do Galeão, e em maio de 1942 foi transferido para a Zona Aérea baseada em Recife, até falecer no dia 16 de dezembro.


Sobre o aspirante Menna Barreto e o sargento Waldir Correia existem poucas informações nos arquivos públicos. Menna foi selecionado cadete-aspirante da FAB em setembro de 1942, pouco meses antes da fatalidade. Sobre o sargento nada foi encontrado.

Tenente França (dir.) e o aspirante Menna Barreto (esq.) - Foto: Reprodução Jornal A Noite

O “Acidente”


Antes de entras nas versões do ocorrido, é preciso explicar que o ano de 1942 foi agitado para o Brasil, que em janeiro tinha rompido relações com a Alemanha, iniciando uma série de ataques dos submarinos U-boots a navios mercantes brasileiros, principalmente na costa do nordeste, culminando em agosto com a declaração do estado de beligerância.


Sobre o acidente, a primeira versão e mais simples dessa história conta que foi uma simples queda de avião, na tarde do dia 16 de dezembro de 1942, devido a uma desorientação do piloto que vinha sobre o mar e caiu no continente, na região conhecida como Mataraca, entre Rio Tinto e Baía da Traição. Apenas isso e sem maiores explicações para a morte dos militares.


Já a segunda versão é mais complexa, com direito a teorias da conspiração, declarações oficiais desencontradas e o desaparecimento de documentos. Neste caso, o UC-61 de matrícula FAB 2681 teria decolado do Campo do Ibura, em Recife, percorrendo o litoral até chegar nas proximidades da Baía da Traição/PB, onde fora alvejado e danificado catastroficamente, com cerca de 30 perfurações de projeteis de arma de fogo disparados de algum submarino alemão ou de alguma tropa quinta-coluna em terra.


Tal alegação ganhou embasamento devido à presença naquela localidade de uma família sueca naturalizada no Brasil no início do século XX, os Lundgren, que viviam em Rio Tinto, onde possuíam extensas faixas de terra e apontada como pró-Alemanha. Sempre que se fala em segunda guerra e a presença do Eixo no Nordeste, aparece a história dessa família, sempre associado ao nazismo e o aparecimento de U-boots no litoral. Porém, nada de concreto que ligue um fato a outro e no caso do nosso avião, apenas a proximidade geográfica como fato narrado.


Neste cenário, o avião estaria voando baixo sobre o litoral, quando foi avistado por um submarino que abriu fogo com suas metralhadoras para não ser denunciado pelos militares à base. Há relatos que submarinos chegavam próximos à costa ou até mesmo tinham acesso ao Rio Mamamguape para pegar frutas e água potável, com ajuda de simpatizantes do Eixo, o que vale a pena ressaltar nunca ter se confirmado.


Mantendo essa narrativa do U-boot, as rotas aéreas do período apontam que esse percurso era pouco usual, pois o trecho principal seria sobre o continente e não pelo mar. Contudo, ainda nos dias atuais, pilotos da FAB e voos civis preferem desviar pelo mar, principalmente por causa da paisagem e fortes ventos. Quanto ao relato de quinta-coluna, diz que eles estariam ocupando a região e com armamento em terra teria abatido a aeronave.

Modelos UC-61 preservado no Musal (Arcervo: Musal)

Tudo isso parece "estórias", mas logo nos primeiros dias o fato ganhou sustentação com uma declaração, que partiu de uma fonte oficial, mas sem provas. Entre 16 de dezembro de 1942 e 19 de janeiro de 1943, a queda do avião não teve repercussão, nem nos jornais locais ou nacionais, sendo tratado apenas como um acidente e de pouco destaque, a exceção da nota de falecimento dos tripulantes, em sua maioria patrocinadas pelos familiares.


Entretanto, entre 19 e 21 de janeiro de 1943, o então ministro da Aeronáutica, Joaquim P. Salgado Filho, concedeu diversas entrevistas, sendo uma delas em especial publicada pelo jornal carioca Correio da Manhã em 22 de janeiro de 1943, alegando que o avião dos militares havia sido abatido com rajadas de metralhadora:


“Fui forçado a não dar publicidade até o presente ao covarde atentado contra um avião da FAB em que sucumbiram... para não comprometer as diligências do inquérito a cargo do coronel Aristoteles Souza Dantas. Agora, porém, que as investigações terminaram, depois de terem sido ouvidas cerca de 120 testemunhas e procedido o exame pericial, posso revelar que esse avião foi atacado por uma rajada de metralhadora de tipo estranho às armas usadas por pelas nossas forças de guerra. O impacto foi de tal natureza que os peritos verificaram que a arma, de grande potencialidade bélica, produziu 28 perfurações no aparelho. Há uma circunstância que é importantíssima para fixar a natureza desse ataque. É que, nesse avião deveria viajar o brigadeiro Eduardo Gomes, sendo ainda também de acentuar que um outro, em que deveria ir à Ilha de Ascensão, teve desaparecimento misterioso onde pairam o avião e seus tripulantes”, fala de Salgado Filho.


A declaração para a imprensa deve ter pego todos de surpresa, principalmente por três detalhes. O primeiro e mais chocante, a aeronave ter sido metralhada em pleno solo brasileiro. Em segundo, o inquérito conduzido pelo Exército ter sido concluído em pouco mais de um mês, com mais de 120 testemunhas ouvidas. E por último, que o comandante da 2ª Zona Aérea, o brigadeiro Eduardo Gomes deveria ser um dos passageiros no dia do acontecimento.


Esses argumentos devem ter colocado a população em alerta, pois até então a guerra acontecia muito longe do continente americano, com ataques a navios no Oceano Atlântico ou do outro lado, na África. Por fim, essa versão se manteve e até o fim da guerra, em 1945, a ideia de que o alvo seria o brigadeiro Eduardo Gomes se sustentou em declarações públicas e artigos de jornais.


Em 15 de julho de 1945, o general Mascarenhas de Moraes participou de solenidade em homenagem aos combatentes mortos na guerra – sobretudo na Itália – na Escola Dom Pedro II, no RJ, e na lista constava o nome do tenente França e do aspirante Menna Barreto.


Quanto a documentação, sobre relatório do acidente pouco se sabe, pois a informação oficial é que se perdeu com o tempo. No Brasil é muito difícil o acesso oficial a tais relatos, sobretudo, antes da década 1940. Vale salientar que os acidentes aéreos passaram a ser melhor investigado a partir dos anos 1960 e no Brasil, pode-se dizer a partir de 1971, com a criação do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).


Em 5 de março de 1943, na comunidade de Coquerinho, em Baía da Traição, o aspirante Menna Barreto deu nome a uma escola pública, enquanto o tenente França batizou a estação telegráfica e o sargento Correia o posto telefônico. Procuramos informações recentes dessas edificações, mas nada foi encontrado. No Arquivo Nacional, existe uma escritura púbica da cidade de Rio Tinto da década 1970, onde consta o nome da Rua Tenente França, a qual não existe mais nos dias atuais. Em contrapartida, existe uma rua projetada com o nomedo Aspirante Menna Barreto, também em Rio Tinto.

Jornal Correio da Manhã - 5 de março de 1943

A investigação das mortes seguiu até abril de 1943, transitando na Auditoria de Guerra da Aeronáutica, quando o auditor Abel Caminha repassou ao promotor Leonam Nobre os autos do inquérito policial militar, procedente da Aeronáutica, que teve como responsável o comandante da 14ª Divisão de Infantaria, o general Boanerges Lopes de Souza. Esta notícia consta no Correio da Manhã, de 7 de abril de 1943.


Na FAB, consta a promoção dos oficiais pós-morte, por meio de decreto publicado em 3 de maio de 1943, tornando: 2° Tenente Aviador o Aspirante Aviador Gabriel Evangelho Menna Barreto e Tenente Aviador o 2° Tenente Aviador José França de Paula Reis.


Os últimos registros encontrados do fato: Artigo de jornal de 4 de setembro de 1945, que trata de Parnamirim Field e um dos fatos relacionados foi a morte dos militares. E em 12 dezembro de 1947, eles foram agraciados com a Cruz da Aviação, medalha em reconhecimento da FAB aos oficiais que lutaram na Itália (Fita A) e no Atlântico contra os submarinos (Fita B).


No pós-guerra, um hangar da FAB no setor Oeste da BANT e estrutura remanescente da Air France dos anos 1920, foi batizado por tenente França. Ele foi desmontado, na década de 1970.



Fonte: Portal Grande Ponto ( via Leonardo Dantas - Centro Cultural Trampolim da Vitória)

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